George Floyd
Crónicas

George Floyd

A indignação que sentimos pelo assassinato de George Floyd é também culpa.
Leio muita gente considerando hipocrisia o protesto que ecoa entre os portugueses, chamando atenção para o facto de que não se geram ondas semelhantes com casos acontecidos em outros países, desde logo, como o grotesco que tanta vezes vai na China. A verdade é que as culturas hoje dominantes da América são radicais europeus. Comungamos de um passado atribulado, feito da valentia e da fealdade que a História conta, e a persistência de determinados ódios são ainda frustrantes tiques da cultura com que nós próprios, europeus, nos identificamos.

Sabemos bem como chegaram os povos negros ao continente americano. Nós, portugueses, não os piores mas entre os piores no que respeita à questão, vivemos talvez demasiadamente demitidos de uma consciência acerca dos efeitos que perduram de um passado que não é tão distante. A indignação com o insuportável assassinato de Floyd é sinal de que há quem se envergonhe, sim, e exija que o Ocidente supere de uma vez por todas os erros do passado. Só então cessará a culpa.

Aziz Asmar e Anis Hamdoun, dois artistas sírios em Idlib, pintam arte mural em tributo a George Floyd
Aziz Asmar e Anis Hamdoun, dois artistas sírios em Idlib, pintam arte mural em tributo a George Floyd

A morte de George Floyd é culpa de todo o Ocidente que mercou a África humana e nunca se redimiu verdadeiramente. Abolida a escravidão, os proprietários foram indemnizados por suas perdas porque se estimava que as economias não suportariam a passagem para uma mão de obra inteiramente paga. Os povos negros, subitamente deitados à rua sem património nem grande caridade, nunca se viram ressarcidos.

Quando a morte de um homem negro acontece diante de câmaras de filmar cometida por um branco racista não elimina do Mundo a morte de tantas outras pessoas injustiçadas que nos devem indignar. Mas a morte de uma pessoa negra às mãos de um racista americano é, sim, um assunto nosso. Não se indigna quem ainda não chegou à dignidade de entender que a sua condição branca é um privilégio que o passado lhe deu, o mesmo passado que legou a tantos negros uma tragédia contínua que nos compete fazer tudo para terminar.

Não defendo violência alguma, entendo porque alguma violência acontece. Não entendo o racismo. Posso entender a fúria contra o racismo. Melhor modo de solucionar o problema passa por sermos todos implacáveis com os racistas. Metidos em cárcere. Até que se eduquem as novas gerações para uma inteligência maior.
Andrea Jenkins está certa. O racismo precisa de motivar a declaração de estado de emergência por uma questão de saúde pública. É viral, destrói a qualidade de vida de milhões e mata.

Valter Hugo Mãe

NM

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