Vic Florencia
Nazareno por nascimento e de coração, Victor Florencia, mais conhecido por Vic, vive na Grande Área de Toronto, no Canadá, desde os quatro anos de idade. Aqui desenvolveu o seu talento, através de anos de experiência na indústria discográfica internacional e transformou-se num dos mais prestigiados engenheiros de som da atualidade. Vic Florencia, vencedor de um prémio JUNO, trabalhou e trabalha com grandes nomes da música como, por exemplo – Jason Mraz, Five For Fighting, Snoop Dog, Joss Stone, Olivia Newton-John.
Vic tem uma capacidade inata de sentir e compreender o que é realmente necessário numa mistura, tanto a nível sonoro como emocional. Esse é o seu verdadeiro dom. Ama a música e consegue aliar a sua competência e décadas de trabalho em busca da sonoridade perfeita “que não existe” a uma sensibilidade extrema. Respeita os artistas e os produtores com quem trabalha e é também muito respeitado por todos que procuram a sua enorme capacidade de transformar e engrandecer a arte dos outros. Quem com ele já trabalhou reconhece-lhe e aprecia o profundo conhecimento técnico, os muito apurados ouvidos e a sua paixão pela música.
Vic Florencia, um homem de família, de 57 anos, que sente falta do som do mar da Nazaré, e que sonha um dia poder trabalhar e viver em Portugal.
Portugal, a Nazaré, as tradições e a música portuguesa estiveram sempre muito presentes na infância e início da juventude de Vic Florencia e deixaram-lhe marcas que ainda hoje perduram.
Nasci na Nazaré e vim para cá quando tinha quatro anos. Tudo aconteceu da forma mais tradicional, mais ou menos como se fazia na altura, o meu pai veio cá primeiro, em 1970, arranjou um emprego, instalou-se e, dois anos depois, eu e a minha mãe viemos, acho que a 13 de maio de 1972. O meu pai sempre trabalhou na construção civil, durante muitos anos. E a minha mãe tem sido costureira toda a vida, ainda hoje continua a trabalhar, a fazer vestidos de noiva, reparações, alterações e todo esse tipo de coisas. Já aqui em Toronto, nasceu o meu irmão Eddie, ele é sete anos mais novo do que eu. Crescemos na zona de College e Ossington, em Roxton Road. Era uma zona muito portuguesa, onde se jogava futebol depois da escola. A maioria das pessoas eram portuguesas e italianas, muito europeias, o que era ótimo. Quando eu tinha 13 ou 14 anos mudámo-nos para Mississauga, mas mantivemos sempre ligações com a comunidade. Os meus pais estavam envolvidos no Rancho Folclórico da Nazaré, por isso estive sempre exposto à cultura portuguesa. Havia ensaios nos fins-de-semana, eles iam dançar muitas vezes num festival ou num centro comunitário e eu participava sempre nisso. Eu não dançava, mas estava sempre lá numa idade mais jovem. Quando estava a crescer em casa estava sempre o rádio ligado, mas era sempre a rádio portuguesa. E eu fui influenciado por tudo isso. Nunca fui exposto à música moderna, como lhe queiram chamar, ou à música pop, até ter um pouco mais de 12 ou 13 anos, nunca houve rock n’roll ou disco na casa dos Florencia. Mas era definitivamente uma música maravilhosa e ainda hoje gosto muito dela. E sinto que me influenciou. Por exemplo, quando estou com uma banda, se estou a gravar instrumentos acústicos, tenho esses flashbacks dos instrumentos com que cresci e a que fui exposto.
A língua portuguesa como elo fundamental de ligação à família
Quando era mais novo, falava-se português em casa, mas quando fiquei um pouco mais velho, obviamente não com 4 ou 5 anos, mas quando fiquei mais velho, tipo, dez, 11, 12 anos, comecei conscientemente a falar mais inglês em casa, só para o meu pai e a minha mãe ficarem mais à vontade com a língua. Em consequência disso, perdi um pouco do português e isso sempre foi um ponto sensível para mim. Hoje eu percebo muito bem português, leio muito bem e consigo comunicar em conversas mais básicas, mas algo mais intenso já tenho mais dificuldade. Frequentei a escola portuguesa talvez entre o quarto e o sexto ano, acho que dois dias por semana, depois da escola inglesa, mas basicamente aprendi o português em casa, a falar com os meus pais e com a minha família. E quando a minha avó vinha aqui a Toronto, como ela não falava inglês, eu podia praticar mais o português. Ela vinha cá passar uns seis meses e depois voltava, foi uma altura muito especial para mim e para a minha avó, graças a essa ligação. Mas nós, mesmo quando eu era ainda pequeno, sempre voltámos a Portugal, no mês de julho ou algo assim. Sempre tivemos essa ligação com a família. Tenho uma ligação muito, muito forte a Portugal e à Nazaré em particular, porque foi lá que nasci e tenho lá muita família. Sou uma pessoa muito virada para a família. Sou muito abençoado por ter dois filhos maravilhosos e uma mulher maravilhosa. Ela é canadiana, os pais dela eram escoceses e ingleses, mas ela é muito portuguesa. Adora estar em Portugal. E tem a bagagem feita. Ela muda-se para lá amanhã, se puder. E, depois, adoramos a comida portuguesa. A minha mãe é uma ótima cozinheira, e os meus familiares em Portugal são todos cozinheiros maravilhosos. Na verdade, a minha mulher é também uma ótima cozinheira e, recentemente, começou também a cozinhar comida portuguesa. E há uma estranha competição entre qual é que eu gosto mais, a dela ou a da minha mãe, por isso nunca respondo a essa pergunta, mas, sim, adoro comida portuguesa. E nós sempre que voltamos a Portugal, compramos peixe fresco, pomos o peixe no churrasco e temos um bom almoço. Por tudo isto, Portugal é tão especial para nós. E ambos os nossos filhos vivem agora na Europa, por coincidência. Os meus pais sempre quiseram que mantivéssemos essa ligação com a família em Portugal. E eu e a minha mulher fizemos o mesmo com os nossos filhos, quando eles eram pequenos. Eles iam para lá e conheciam os primos não só por fotografia ou por telefonema. Conheciam-nos porque estavam juntos na praia com eles e passavam esse tempo juntos. E eu tenho uma ligação muito, muito forte com isso. E tenho alguns familiares maravilhosos que adoro e com quem adoro passar tempo. E quando volto a Portugal, o meu objetivo é passar tempo com eles. Sim, estamos de férias, mas o que importa mesmo é passar tempo com a família.
Filhos longe, mas sempre perto
A minha filha tem 26 anos e está a viver e a trabalhar em Portugal, e o meu filho tem 28 anos e está a viver e a trabalhar em Barcelona. O meu filho trabalha em eventos, entretenimento, concertos e todo esse tipo de coisas. Eles cresceram sempre com um estúdio em casa, por isso estiveram expostos a todos os tipos de música. Todos os dias algo diferente. São grandes amantes de música, mas não são músicos. A minha filha toca um pouco de guitarra e adora. O facto de estarem a viver longe de nós é difícil, mas ao mesmo tempo é gratificante, porque sei que os meus filhos são felizes e estão a viver a vida. No outro dia, alguém me perguntou: “Vic, o que é o sucesso para ti?” E eu disse: “Para mim, o sucesso é o facto dos meus dois filhos adultos gostarem de passar tempo comigo e com a minha mulher, isso é fantástico”. Não posso pedir mais. Ganhei a lotaria. Por isso, sim, é difícil porque temos saudades deles, mas é uma boa desculpa para ir a Portugal, felizmente um vive em Portugal e outro ali ao lado, em Espanha. Por isso, vamos para lá em maio e já estamos a combinar para que venham ter connosco, e assim podemos estar juntos, como uma família. Por isso, é muito gratificante. Sei que eles são muito felizes e que estão a experimentar a vida. E o que mais posso pedir como pai? Simplesmente, mais nada.
Não foi fácil admitir, perante os pais, que a vida profissional o levaria para um trabalho menos convencional. Perante si próprio, precisou perceber que a sua vida estaria para sempre ligada à música, mas não como instrumentista.
Demorei muito tempo a admitir que não queria ser músico, queria ser engenheiro. Foi uma transição um pouco difícil, mas não me arrependo de nada. Lembro-me do primeiro dia em que entrei num estúdio de gravação e pensei: “Pronto, vou guardar a minha guitarra. Este é o meu caminho”. Os meus pais apoiavam muito o que eu queria fazer, mas foi um pouco estranho para eles. Este não é um caminho tradicional para pessoas e famílias que querem fazer as coisas tradicionais, quer seja na área da construção, como contabilista, advogado ou o que quer que seja, tudo profissões muito respeitosas, claro, mas a música, para mim, sempre foi uma grande paixão. Aos 12, 13 anos de idade eu queria ser uma estrela do rock and roll. Queria ser guitarrista numa banda, mas por volta dos 16, 17 anos, quando comecei a ouvir com atenção e a ser exposto a todos discos e bandas diferentes, comecei a olhar para a parte de trás dos discos e queria saber como eram feitos, desde a produção à engenharia e todo esse tipo de coisas. E assim que comecei a percorrer esse caminho e entrei num estúdio, vi todas as luzes e todos os botões… para mim acabou. Eu sabia exatamente o que queria fazer. Lembro-me agora do dia, do minuto.
Decisão tomada… começou a caminhada, com passos firmes, para se tornar num dos mais reconhecidos engenheiros de som no Canadá e não só.
Fui para uma escola de gravação aqui em Toronto, chamada Toronto Recording Workshop, que já não existe, só para obter um diploma. Sabes, estávamos no tempo em que se podia entrar num estúdio de gravação e dizer: “Ei, deixem-me começar, estou mesmo interessado nisto”. E podíamos começar a limpar o chão e as casas de banho e a fazer comida e, eventualmente, entrar no estúdio, mas achei que era necessário ter algum tipo de diploma. Por isso, fui para a escola, obtive o meu diploma, fui à procura de emprego e tive muita sorte. Consegui um lugar como engenheiro assistente num estúdio chamado Number 9 Audio Group, que ainda existe. E foi aí que comecei. Depois disso, fui para um estúdio, chamado McLure Place, que já está fechado. E era um estúdio maravilhoso. Tinham tecnologia muito moderna, consolas SSL, que são as consolas de mistura mais comuns do mundo. Por isso, fiquei a conhecer aquilo e estive lá durante 3 ou 4 anos como assistente e depois também como engenheiro. Mas, entretanto, comecei a trabalhar com um dos meus mentores, um senhor chamado Lenny DeRose, que considero ser um dos melhores engenheiros de som, de sempre. E ele deu-me a confiança e a oportunidade de trabalhar por conta própria. Fiquei na McClure durante vários anos e depois despedi-me e fui trabalhar como freelancer num projeto noutro sítio. E foi mais ou menos aí que tudo começou. Trabalhei com uma lendária artista canadiana chamada Lisa Dal Bello (Dalbello). Esse foi o meu primeiro trabalho como freelancer, graças a Lenny DeRose, e a partir daí tudo evoluiu. Depois disso, nunca mais trabalhei noutro estúdio. Houve estúdios em que trabalhei muitas vezes, mas basicamente reservava o estúdio por dez dias, por exemplo. E uma vez que a tecnologia, nos últimos 15, 20 anos, mudou tanto, comecei a pensar e decidi: “Sabes que mais? Preciso do meu próprio estúdio”. Por isso, construí um estúdio ótimo e maravilhoso. Acho que é espetacular.
A transição do analógico para o digital
Hoje sinto que sou um melhor engenheiro devido à forma como fui educado neste sector e por ter trabalhado numa era bem diferente da que vivemos hoje, em termos tecnológicos. Muitas das novas tecnologias baseiam-se, por exemplo, em todos os plugins baseados em coisas antigas. Eu penso: “Bem, eu sei que costumava trabalhar com isso, e sei como alinhar aquela máquina de duas polegadas e a multipista e todo esse tipo de coisas”. Sei tudo isso. Por isso, sim, sou muito privilegiado por ter essa experiência e por ter trabalhado com estes engenheiros lendários, com técnicas de captação que ainda hoje aplico no meu trabalho diário, quer esteja a gravar ou a misturar. Tudo resulta do facto de eu ter crescido no mundo do áudio, absolutamente. Qualquer pessoa que diga que é um mestre nisto ou naquilo é um tolo. Aprendi com cada um dos projetos em que trabalhei. E agora, com a tecnologia a mudar diariamente, sempre estive aberto à tecnologia desde o tempo do mundo analógico. Lembro-me que, quando o digital surgiu, toda a gente dizia: “Oh, isto é terrível”. Sim, o som não era tão bom, mas eu sabia que era o futuro. Por isso, estou muito aberto a novas tecnologias e novas abordagens. O que posso fazer para estar a par das coisas agora? Recentemente, atualizei o meu estúdio para poder utilizar o Atmos e o áudio espacial. E esse é o novo tipo de tecnologia. Por isso, estou aberto a isso, porque está a mudar todos os dias.
O engenheiro de som e o artista – uma relação de cumplicidade e respeito
Por vezes, faço uma mistura e penso: “Isto parece-me fantástico”. E o artista diz, “oh, sim, mas eu quero que seja assim”. Outras vezes digo: “não está a soar como eu queria”. Os artistas dizem: “É exatamente assim que eu quero”. Portanto, é a forma como recebemos a música. Tem tudo a ver com a forma como absorvemos a música, as nossas ideias, a nossa perspetiva. É tudo uma questão de gosto pessoal. Tentamos encontrar um meio-termo em que o artista esteja feliz e eu esteja feliz. E, obviamente, o artista e o produtor é que mandam. Por isso, vou fazer tudo o que puder para os fazer felizes, mas, ao mesmo tempo, eu também preciso de ser feliz. Por isso, há sempre um meio-termo que se pode encontrar, sem dúvida. Tive a sorte de trabalhar com alguns artistas de grande sucesso. E posso dizer-vos honestamente que todos eles foram uns queridos. Foram todos pessoas maravilhosas, muito recetivas, muito abertas às minhas ideias. Às vezes, és um engenheiro e um misturador e também és um pouco psicólogo e terapeuta na sessão, porque estás a tentar fazer tudo o que podes para que essa pessoa chegue onde quer e para que tudo flua. Mas tenho tido muita sorte na minha carreira. Sim, há algumas histórias de pesadelo que aconteceram com artistas, egos e coisas do género, mas acho que tenho tido muita, muita sorte com os artistas. Quanto à razão pela qual me escolhem para fazer o trabalho de mistura, não creio que alguém olhe para mim e diga: “O Vic só faz música rock ou só faz música pop”. Mas penso que tenho uma certa forma de lidar com as coisas, especialmente com as vozes e outras coisas, a forma como as trato e a perspetiva geral de uma mistura. Mas é tudo uma questão de gosto pessoal. Eu diria que 99% do trabalho que recebo é porque as pessoas ouviram coisas que eu fiz, ou falaram com artistas e produtores que trabalharam comigo e recomendaram-me. O boca-a-boca é a chave para mim, no meu sector. Acho que isso é uma prova do trabalho que estou a fazer, que as pessoas estão a gostar e estão satisfeitas com o que estou a fazer. E eu sou sempre muito crítico. Sou o meu pior inimigo. Estou sempre a perguntar se pode ser melhor. Estou sempre a tentar alcançar a perfeição sonora, que não existe. É muito difícil porque, por vezes, damos uma volta completa, fazemos um 360º e voltamos ao ponto de partida. Por isso, é difícil saber quando é que a mistura está pronta. Quando é que a canção está pronta, quando é que a produção está pronta. E, sabes, tudo se resume, acho eu, aos meus ouvidos e à forma como ouço as coisas.
Por vezes é preciso parar, andar de bicicleta e reencontrar o equilíbrio
Demorei muito tempo a perceber que precisava de fazer isso e, de vez em quando, dou aulas em certas faculdades e é sobre isso que eu falo. É como se tivesses de tentar encontrar um equilíbrio. Quando comecei, não estou a mentir, trabalhava 18 horas por dia, todos os dias, durante meses a fio. E foi como se isso me tivesse afetado muito. Por isso, temos de encontrar esse equilíbrio. E o que eu faço é andar de bicicleta. Sou um ciclista ávido e já andei de bicicleta em Portugal, o que é fantástico. Adoro, por isso é isso que faço. Saio com o meu melhor amigo e andamos de bicicleta durante 3 ou 4 horas e quando chego ao trabalho tenho a cabeça limpa e assim podemos continuar com o nosso dia. Faço muitas pequenas pausas, a minha mulher e eu passeamos o nosso cão e, sim, são apenas 20 minutos aqui ou 20 minutos ali, mas isso permite-me dar um descanso aos ouvidos e ficar um pouco mais lúcido porque, sabes, é bom ter o nosso próprio estúdio, mas às vezes quando nos apercebemos, “oh meu Deus, estou a trabalhar nesta música há dois dias e é como se a minha mistura estivesse melhor há dez horas atrás”. Por isso, há esse equilíbrio que temos de encontrar. Sair e limpar a cabeça.
Inteligência artificial – o admirável e assustador mundo novo
Quando se trata de usar a inteligência artificial para coisas como corrigir ruídos e todo esse tipo de coisas, tudo bem, mas quando se trata de escrever letras e canções e coisas do género, estou um pouco preocupado com o futuro disso, porque acho que tira a criatividade aos artistas. Por isso, estou um bocadinho preocupado. Não sou fã. Acho que tudo pode ser usado como uma ferramenta para influenciar a tua escrita. Sou totalmente a favor disso. Influencia-me porque posso fazer com que algo soe sonoramente melhor, porque analisei algo e apliquei-o, e é sonoramente melhor. Não me importo com isso. Mas se algo estiver a escrever letras para mim ou mudanças de acordes, não sou um grande fã disso, porque sou um tipo da música. Adoro os artistas. E hoje há certas coisas que são bastante óbvias para mim e para as pessoas que estão expostas a isso, que tenham um ouvido treinado. A realidade é que em muita da música moderna a única coisa que é real é a voz. Tudo o resto é gerado virtualmente, mas há certas coisas que se destacam imediatamente e que, o ouvinte comum, talvez não perceba, especialmente em algo que é muito produzido. Mas tenho de dizer que a inteligência artificial está a ficar cada vez melhor. É bastante assustador.
E o que gosta de ouvir Vic Florencia enquanto amante de música?
É difícil para mim ouvir música e não pôr o meu chapéu de engenheiro e de misturador e analisá-la, mas adoro. O pop rock é definitivamente o que gosto de ouvir e trabalhar. Mas eu não cresci com isso. Cresci com música mais tradicional, seja folk ou música acústica ou bandas de hard rock. No fim de contas, adoro cantores e compositores, particularmente artistas femininas, onde as coisas são um pouco mais despojadas, como uma voz feminina com guitarra acústica e apenas uma secção rítmica simples. O que importa é a melodia. Para mim, é tudo sobre a melodia.
Quando o trabalho do engenheiro de som se cruza com o homem apaixonado por Portugal e encontra pessoas como Tony Carreira
Bem, tenho tido muita sorte. Fiz alguns trabalhos em Portugal, muitas vezes com artistas não portugueses. Há um estúdio no Porto chamado Arda, que é um estúdio maravilhoso, mas também tive a oportunidade de trabalhar no estúdio do Tony Carreira, em Almada, do outro lado do rio. Um belo estúdio. E tive a oportunidade de trabalhar com o filho, David Carreira, e fiz-lhe duas misturas Atmos dos seus singles. Por isso, tenho trabalhado com alguns artistas portugueses, mas adorava trabalhar com alguém como trabalhei com o Tim (Xutos e Pontapés) no passado. Adorava voltar a trabalhar com ele, porque me diverti imenso, passei um tempo maravilhoso aqui no estúdio da MDC. Esses artistas são fantásticos, mas ainda mais fantástico é o facto de ter essa ligação e poder telefonar ao engenheiro do Tony, ou a pessoas que conheço muito bem e dizer: “preciso de uns dias no estúdio” e eles ajudam-me. Tratam-me como se fosse da família. Da última vez que estive no estúdio do Tony, estive lá durante cinco dias e almoçámos juntos todos os dias. Ele estava no churrasco a fazer sardinhas para mim. E estávamos a ter uma conversa como a que nós estamos a ter agora. Falávamos 5% de negócios e 95% de família e social. É ótimo. Ele é um ser humano maravilhoso. Gosto muito de lá estar. Por isso, sim, espero que apareçam algumas coisas por lá. Adorava poder trabalhar mais lá, talvez passar 3 ou 4 meses em Portugal todos os anos para trabalhar.
Juno Awards – a honra e o orgulho
Fui nomeado três vezes – na primeira vez não ganhei, depois, na segunda vez que fui nomeado, ganhei, e depois fui nomeado uma terceira vez. Foi uma honra e um privilégio absolutos ser mencionado e premiado pelos meus pares, pessoas que admiro. Não diria que, depois de ter ganhado o Juno, o telefone tocou como um louco para mais trabalho, mas, sabes, há um prestígio nisso. Há uma honra em tê-lo. E é uma coisa boa poder mencionar. E as pessoas reconhecem isso. Esse feito foi uma honra para mim, a 100%. Mas, até hoje, continuo a retribuir à comunidade Juno. Nos últimos dois anos, fui presidente do comité de engenheiros de gravação e continuo a participar ativamente e a fazer tudo o que posso para contribuir para a nossa comunidade musical e para o futuro da nossa indústria. Há engenheiros que estão a surgir e que são engenheiros fantásticos, que eu tive um papel em moldá-los quando eram mais novos, ensinando-lhes um pouco como fazer isto e, mais importante, o que não fazer. Adoro retribuir ao futuro do nosso sector. Quero que o nosso sector seja representado por canadianos maravilhosamente talentosos. E acreditem em mim, há muitas pessoas maravilhosas que fazem o que eu faço e que são super, super talentosas. E, se eu puder oferecer alguns conselhos e dar alguma orientação, estou sempre disposto a isso. Recebo chamadas a toda a hora, tal como ligo a alguns dos meus colegas e digo: “Estou a ter este problema”, e eles atendem o telefone e conversamos. Sim, são meus concorrentes e assim, mas continuamos a ter um respeito mútuo, porque se estás a ter um problema, vou fazer tudo o que puder para te ajudar a resolvê-lo e para que possas voltar a trabalhar. Retribuo o mais que posso. E há alguns engenheiros que, até hoje, me chamam Tio Vic e Padrinho Vic e é uma honra. É um privilégio. Sinto uma grande alegria com essas coisas.
Regresso às origens – um sonho que pode tornar-se realidade
Espero poder, nos próximos anos, construir um pequeno estúdio lá em Portugal. Não tenho a certeza se vou viver lá a tempo inteiro, mas adorava poder passar mais tempo lá, talvez 3 ou 4 meses por ano a trabalhar lá, porque a tecnologia permite-me fazer isso. Por exemplo, posso estar a trabalhar numa mistura, como aconteceu ontem, com a minha cliente na Alemanha e ela estar a ouvir a minha mistura ao vivo e comunicarmos através da tecnologia. É maravilhoso. Por isso, posso estar a fazer isso em Portugal. Adorava poder fazer isso, porque me vai dar a oportunidade de conhecer mais artistas portugueses, mas, mais importante, de estar perto da minha família.
Entrevista: Madalena Balça | Fotos: Mike Neal / Família Florencia