Tesouros da literatura lisboeta
Que há muita história por todos os lados da europeia nação portuguesa já é de conhecimento público. Há roteiros para os gostos variados que vão do turismo ultrarrápido (abrangendo muitas visitas em curtos espaços de tempo em razão das circunstâncias que assim o preferem os seus turistas) até à expedição detalhada quando se trata de estudos e curiosidade mais abrangente. Não obstante, mesmo nos casos nos quais o olhar pormenorizado predomina sobre a maravilhosa vastidão do cenário disponível, é possível, ainda assim, passar ao lado de uma oportunidade valiosa despercebidamente. É aí que entra um pouco da pesquisa ao acessar as informações distribuídas na internet, então novas e apaixonantes situações incidem como os raios de sol matutino aos passos daquele que trilha cuidadosamente a vereda da cultura.
É o delicioso caso de Lisboa, sobretudo o seu colossal centro histórico que possui nada menos do que camadas de memórias que ecoam através dos achados arqueológicos, remontando a épocas antiquíssimas. Mas o inebriante baile das aspirações pessoais tende a tocar certas músicas cuja preferência é ditada por insubmissa maioria, ou seja, nada como os castelos e os palácios no centro das atenções, tendo como harmonioso fundo a valsa das explicações dos guias turísticos de plantão. Mais: em meio ao transe medieval das pedras e dos calabouços ou das imensas mesas de refeições monárquicas e dos suntuosos jardins ricamente desenhados há um inspirador espaço para uma parte da alma portuguesa, que também é constituída pela literatura, uma tradição secular de nomes imponentes como Luís Vaz de Camões e Fernando Pessoa, o popstar da poesia que continua a invadir a alma dos jovens por seu rebelde desassossego. Até quem não os leu é capaz de identificá-los pelas fotos ou caricaturas. Mas e os demais gênios que deixaram as suas marcas com o saboroso arranjo das letras, o manjar dos deuses grafado à posteridade?
Ah! Sim, há muitos outros escritores e poetas famosos também conhecidos, assim, portanto, destacam-se aqui tão somente quatro deles por força da presença que os une ao antigo ‘Bairro Alto’, uma região que demonstra ter mais histórias a contar do que de facto revela, numa espécie de segredinho que requer o afável levantar do véu a fim de que se espreite o que há por debaixo.
São eles o poeta Manuel da Bocage (1765-1805), que faleceu na casa situada na travessa André Valente; Almeida Garrett (1799-1854), que morou na rua da Barroca, 46; Camilo Castelo Branco (1825-1890), nascido ali no número 13 da rua da Rosa, cuja biografia é senão toda uma coleção de romances e dramas a toda prova ao leitor de mão cheia, os três, portugueses, e o francês Júlio Verne (1828-1905) – até tu, Julius! -, que percorria as águas atlânticas, deixando o seu iate em Cascais, prosseguindo viagem até Lisboa para ir ter com o seu editor à rua da Atalaia, endereços próximos à fabulosa Igreja de São Roque e de outros nomes a serem mencionados oportuna e devidamente. O espírito que paira sobre este sítio é de penetrante essência, pois além dos incontáveis moradores, acolheu os pensamentos e sentimentos transmutados à pena dos magistrais que ali passaram: nascendo, vivendo, negociando ou morrendo…
Eis alguns tesouros lisboetas que se mantêm razoavelmente ocultos aos olhos e às emoções do fascinado historiador de grau turístico, à espera do gentil e ao mesmo tempo audacioso gesto de exploração às vias que abrigam a alma da refinada literatura de uma das mais charmosas e cultas cidades do antigo continente.
Armando Correa de Siqueira Neto
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