Para onde caminhamos?
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Para onde caminhamos?

Muitas vezes ouvimos discursos e intervenções sobre as qualidades da comunidade portuguesa radicada no Canadá, com as quais não vou discordar, mas dou comigo a pensar frequentemente sobre o caminho que percorremos, o qual confesso não ser conhecedor da sua verdadeira extensão por razões que se prendem com a minha chegada ao Canadá apenas no início do século; onde nos encontramos, tirando proveito de alguma proximidade com alguns meios de comunicação social, líderes e empreendedores da comunidade; e para onde vamos, como português da diáspora, como cidadão do mundo, na qualidade de pai, marido, empreendedor autodidata e sonhador (peço encarecidamente que me autorizem o atrevimento ou devaneio).

Se o passado pode, de uma forma ou de outra, ser certo, assentando no trabalho árduo daqueles que em tempos pioneiros se dedicaram ao desenvolvimento da comunidade, enfrentando obviamente obstáculos e desafios únicos inerentes a um povo recém-chegado a um país estranho, o presente demonstra que devemos muito à dedicação daqueles que se entregaram ao desígnio de preservar e divulgar os bons costumes e cultura lusitana em terras canadianas. Pergunto-me… será que damos o devido valor a todos quanto dedicaram grande parte da sua vida em prol da comunidade?
Ouso dizer que não! Admito que se reuniria facilmente o nome de muitas dezenas de lusodescendentes que foram fundamentais no garante de tudo o que podemos disfrutar nos dias de hoje. Não apenas na nossa comunidade, mas também no plano provincial e nacional.

Não tenho a pretensão de ser eu a nomear esses Portugueses de Valor (leia-se PORTUGUESES com letra maiúscula e não aqueles que, por motivos que pouco tem que ver com o seu valor profissional, moral, ético ou comunitário, vão receber uma “estatueta” a terras “longíquas”), até porque como foi acima referido, apenas muito recentemente embarquei nessa aventura denominada “emigração”, mas a todos os que contribuíram para que possa orgulhosamente “vestir” a camisola portuguesa no Canadá o meu OBRIGADO.

O presente, porém, levanta dúvidas e questões que tenho noção serem de difícil resposta, mas que entendo serem essenciais na forma como deveremos olhar para o futuro. Apenas com o debate do presente podemos almejar construir um futuro melhor sem nos aburguesarmos às certezas do que já é nosso por conquista e direito. Como diz o provérbio… “palavras, leva-as o vento”! Com o devido respeito, parece-me que caímos muitas vezes e muito facilmente na tentação desse exercício banal de “tentar reinventar a roda”!

Senão vejamos… será rara a intervenção pública em que não se ouçam as palavras “novidade”, “modernizar”, “inovar” e outras tantas! Eu pergunto-me… onde está a novidade de semanas culturais e eventos comunitários que na sua maioria se repetem ano após ano com as mesmas atividades, os mesmos artistas, os mesmos presidentes, as mesmas direções, os mesmos participantes, os mesmos menus, os mesmos interesses… enfim, sempre “o mesmo”?! Não julguem, porém, que não entendo as dificuldades inerentes à organização de tais eventos. Apenas faço a contatação de um facto.

Façamos o simples exercício de admitir que no Ontário existam cerca de 300 ou 400 mil lusodescendentes. Será que alguém de direito me consegue explicar porque razão estes números não se refletem no nível de participação nos eventos comunitários?

Parece-me consensual que as faixas etárias predominantes dos presentes em eventos comunitários, com exceção da Semana de Portugal com as suas particularidades, são as dos 50, 60 anos de idade e sempre na ordem das poucas centenas. Pergunto-me qual será a razão do total desinteresse das camadas mais jovens?!

Para nós, meios de comunicação social, fica a também a pergunta… porque não temos a atenção e o apoio da comunidade no seu todo? Estaremos nós a fazer o que realmente é pedido a um orgão de comunicação social? Estaremos nós cativos de interesses financeiros, sobretudo pela forma gratuíta como prestamos este serviço?! Seremos nós também responsáveis, cultivando a ideologia da intriga e guerras de egos desmedidos preferindo prejudicar os nossos colegas a desempenhar um papel fundamental e único no desenvolvimento da comunidade?!

Intriga-me o facto de não se estimular o ensino do português na comunidade, preferindo-se a chamada “fuga para a frente”, tentando-se adaptar a realidade do dia-a-dia à deficiência notória que afeta sobretudo os jovens que emigraram em tenra idade ou que nasceram no Canadá. Ignorar as evidências nunca foi solução para qualquer mal. A língua portuguesa será sempre o pilar da nossa comunidade, sendo ferramenta vital na preservação e divulgação da nossa cultura, costumes e valores ideológicos. Como costumo dizer e passo a expressão, ser português é muito mais do que “comer umas bifanas, saber assar umas sardinhas, dançar o vira e beber uns tintos”! Será esta a razão para os recém-chegados não se integrarem ou não alinharem nas mais diversas ações comunitárias?!

O choque cultural entre a realidade que se encontra na nossa comunidade e as matrizes do nosso país de origem exigem que haja uma remodelação implementada pelos responsáveis comunitários que tem de passar pela inovação sem tentar “reinventar a roda” mas também, e principalmente, pelo ensino e divulgação da Língua Portuguesa.
Atente-se que sou de opinião que a aprendizagem do Inglês ou Francês no Canadá é fundamental à integração dos imigrantes chegados a este país, mas não posso aceitar que se reduzam as nossas raízes à insignificância da “bifana, sardinha, vira e tinto”!

E nós pais e avós… estaremos a desempenhar o nosso papel baseado no modelo de valores familiares a que fomos habituados ou vamos aos poucos cedendo às rotinas do quotidiano, esquecendo por completo as nossas raízes, tradições e a comunidade que, para o bem e para o mal, tanto nos ofereceu ao longo dos anos?!

E os empreendedores, patrões, homens e mulheres de negócios… estarão a desempenhar o seu papel instrumental de evolução da diáspora no Canadá, cultivando e divulgando os valores e bons costumes portugueses, ou preferem olhar para o lado e dirigir os nosso esforços para os mais básicos instintos financeiros passando por cima de tudo e todos?!

Inquieta-me, acima de tudo, saber que há muitos milhares de lusodescendentes que não se conseguem identificar ou simplesmente se alheiam do modelo de comunidade que temos. O presente artigo de opinião não tem qualquer objetivo político ou tentativa de culpabilizar quem quer que seja, mas sim alertar para a necessidade urgente de debate sem tabus e interesses. Estaremos nós também condenados ao desmembramento da comunidade, em tudo semelhante ao que aconteceu, tanto quanto julgo saber, com a comunidade Italiana no passado?
É o futuro dos nossos filhos e netos que está em causa.

Fica a pergunta… para onde caminhamos?

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