Cabbagetown é um dos bairros residenciais mais desejados da cidade de Toronto. Localizado a sul da Bloor Street, e a este da Parliament Street, esta área da cidade atrai pela beleza arquitetónica das inúmeras casas vitorianas e mistura eclética de outros estilos de construção que a tornam distinta.
O nome pelo qual é conhecido faz-nos recuar à primeira metade do século XIX, quando os imigrantes irlandeses se estabeleceram no Canadá, a partir de 1840, na época da grande crise da fome na Irlanda. Habitado por muitos desses imigrantes pobres, em casas modestas, a sul da rua Gerrard, os jardins eram usados para cultivar legumes, em particular repolhos, o que desagradava aos anglófonos mais afluentes, estabelecidos nas ruas vizinhas um pouco mais a norte. O epíteto vem dessa época.
A história de Cabbagetown, no entanto, é anterior à ocupação dos colonos. Os povos indígenas acampavam nas terras junto ao rio Don (Don River) onde caçavam, pescavam e colhiam arroz selvagem. Foram encontrados vestígios de acampamentos indígenas na área com artefactos diversos, incluindo peças de cerâmica que comprovam a sua presença.
Riverdale Farm, uma enorme propriedade rural dessa zona, vai desde as margens do Don River até à Rua Carlton, e é muito procurada por famílias com crianças. Com estábulos variados, onde se podem encontrar cavalos, ovelhas, vacas, galinhas e outros animais, é um pequeno oásis para entreter pais e filhos nessa área urbana. Foi aí que, em 1899, foi fundado o primeiro Jardim Zoológico de Toronto, com leões, ursos e macacos. Veio a fechar em 1974 para ocupar um espaço maior na vizinha cidade de Scarborough. Numa das ruas de Cabbagetown, podemos ver a placa indicativa da bonita casa onde residia Daniel Lamb, o criador do Zoo.
Outras casas atraentes, em estilo neogótico, dessa área residencial, altas, estreitas, com janelas salientes, decoradas com vitrais coloridos e empena frontal pontiaguda convidam-nos a parar e admirá-las. Os jardins bem cuidados e as árvores frondosas dão a essas casas a privacidade desejada. Nas ruas estreitas, vielas e becos somos surpreendidos por habitações mais pequenas e singulares, artisticamente planeadas.
Durante a Depressão e Segunda Grande Guerra, Cabbagetown entrara em decadência. A partir da década de setenta grandes mudanças se verificaram, e novamente se começou a valorizar esta área da cidade. No final dos anos 1980, os residentes organizaram-se e uniram-se para preservar e reconstituir algumas das mansões e propriedades que precisavam ser recuperadas. Muitos eram escritores, artistas plásticos, políticos, jornalistas e outros com influência e conhecimentos do valor histórico dessa zona central de Toronto. Hoje Cabbagetown é uma zona arquitetónica protegida.
Neste bairro estão localizados dois dos cemitérios mais antigos de Toronto, o St. James Cemitery, de 1844 e o Necropolis Toronto, de 1850. Estes cemitérios são autênticos jardins verdejantes no meio da cidade, convidativos a caminhadas ou a passar algumas horas relaxantes num banco de jardim. Figuras marcantes da histórica da Província estão sepultadas no Necropolis Toronto: o primeiro presidente da Câmara, William Lyon Mackenzie, o fundador do jornal Globe and Mail, George Brown, o Chefe do Partido do NDP, Jack Layon entre outros.
Winchester Street é uma das minhas ruas favoritas de Cabbagetown. Ali, na antiga Gerrard St. Church funciona ainda o Winchester Theater. Com uma programação variada, foi naquele espaço clássico que, pela primeira vez vi, nos anos noventa, um espetáculo de dança moderna do jovem bailarino brasileiro Newton Morais, artista que nos continua a deslumbrar com sua arte.
Talvez o edifício arquitetonicamente mais grandioso continue a ser o antigo Winchester Hotel e salão (também conhecido por LakeView Hotel), uma construção de 1888, em estilo imperial. Na esquina sudeste das ruas Winchester e Parliament, este majestoso prédio, dividido agora em espaços comerciais diversos, continua a fazer-nos parar e refletir em tempos áureos que ficaram na história da cidade.
Ao caminhar por Cabbagetown, não podemos deixar de reparar que muitos residentes exibem a simbólica bandeira branca com um repolho verde. Para quem seja curioso, e queira descobrir o interior das mansões, os residentes do bairro proporcionam visitas guiadas, em certos dias por ano. Os fundos angariados revertem para a preservação da identidade do bairro.
Manuela Marujo
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