Sagres
Entrevistas

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Créditos: Alberto Nogueira

 

Foi a 12 janeiro de 2013 que Armando Janeiro, Carlos Janeiro, Patrick Janeiro, Paulo Milheirão e Mike Nazário formaram a banda SAGRES. A estreia oficial acontece em dezembro de 2013 no Centro Cultural Português de Bradford. Anos mais tarde, Nuno Maltez juntou-se à banda para substituir um dos elementos fundadores.
O grupo de Bradford atuou pela última vez, no dia 14 de maio, no palco do Nathan Philips Square em Toronto nas celebrações dos 70 Anos Canadá – Portugal The Festa, depois de uma década de sucessos no Canadá e nos Estados Unidos da América.

Este mês convidámos Armando Janeiro para uma conversa onde ficámos a conhecer um pouco mais da história desta grande banda luso-canadiana que, com certeza, vai deixar saudades.

Como nasce a banda SAGRES?
Na época, eu e o meu irmão, o Carlos, estávamos praticamente fora da música, tocávamos, mas não era nada consistente. Eu tinha e tenho uma sala com os instrumentos todos… órgãos, guitarras, violas baixo, baterias, etc., mas na altura não tinha bateria. Quando os meus filhos eram pequeninos, num certo Natal, eu tinha falado com o meu colega da banda Português Suave para comprar-lhe uma bateria e fizemos negócio. Chegou o dia e a bateria não tinha chegado, mas os dois pares de baquetas que tinha comprado já estavam embrulhadas e debaixo da Árvore de Natal. Os meus filhos gostavam mesmo muito de abrir presentes no dia de Natal e na hora de abrir os presentes, deixámos as baquetas para os últimso dois presentes a serem abertos, mas assim que as viram correram para a sala onde estavam os outros instrumentos e ficaram desgostosos por não verem a bateria… onde quero chegar é que quando chegou a bateria os dois começaram a tocar bateria…

… e qual dos dois teve mais aptidão para a bateria?
O que deu mais na bateria foi o Patrick, o mais novo… estava-lhe no sangue. Comecei a vê-lo a aprender, que tinha um bom ritmo, bom ouvido e na tecnologia era mesmo muito bom, tanto que começou a tocar numa bateria eletrónica. E foi nessa altura que disse ao meu irmão: “Carlos, é pá, nós temos que fazer alguma coisa porque o garoto é mesmo bom e nós temos que arranjar alguém para nos ajudar”, ou seja, para arranjar outro teclista. É assim, o meu irmão também sabe tocar órgão…

O Armando queria fazer uma banda com o seu filho e o seu irmão?
Sim… nisto, falámos com um primo nosso, mas só ficou três anos connosco e para o lugar dele entrou o Mike Nazário, que é de Trás-os-Montes, que eu e o meu irmão já conhecíamos, porque nós os três já estamos nesta vida há muitos anos… eu comecei no dia 8 de agosto de 1978. E, depois apareceu o Nuno Maltez que é de Vila Real, que para além de ser um muito bom teclista, também toca concertina e mais tarde descobrimos que também cantava. O Carlos era o vocalista principal, eu cantava 2 canções, o Mike começou a cantar também e sabíamos que o Nuno sabia cantar… só faltava o Patrick.

Antes da SAGRES, vocês tinham feito parte de outra banda?
Sim, chamada Português Suave, mas houve outras.

Português Suave… é um nome interessante (risos)…
(risos) É engraçado, sim… sempre escolhemos nomes assim para as nossas bandas. Nós queríamos nomes que dessem que falar.

O Patrick começou a cantar mais tarde…
… sim e como era um rapaz mais novo, escolhemos umas canções novas… mais do tempo dele. E foi assim que ele começou, a cantar Perfect do Ed Sheran no Centro Cultural Português de Mississauga.
O Patrick também toca guitarra, certo?
Aqui em casa os dois tocam também guitarra… aliás, os meus filhos tocam os instrumentos todos.

E porquê o nome SAGRES?
SAGRES, para nós não é a marca da cerveja, mas é para a maior parte das pessoas quando veem ou ouvem o nome pela primeira vez…

É o navio?
É e porquê o navio? Porque nós vimos de uma família de pescadores.

De que zona de Portugal?
Somos da Praia de Mira… é uma vila muito pequena, mas é uma terra de pescadores.

E para além do Carlos, têm mais irmãos?
Temos mais um, o Paulo que é o mais novo.

E já agora, o Paulo também é músico?
Sim, o Paul também é e esteve no grupo há uns anos atrás. O Paul tocava guitarra e é bom.

De onde é que vem essa veia artística? Quem da família é que tinha essa veia?
Isto começou já com o meu avô, José Maria Porto, o Porto é alcunha, ele chama-se José Maria Clemente e ele cantava e tocava guitarra em Portugal. Nós crescemos a ouvir o meu avô. Depois, o meu tio também começou, mas ele já foi mais além. O meu tio já esteve na televisão e em todo o lado a cantar. O meu tio nos dias de hoje vai aos lares de velhinhos, pelo menos uma a duas vezes por mês, cantar as canções antigas que eles gostam e mete-los todos a cantar. O filho desse meu tio, portanto, o meu primo, João José Clemente, tem neste momento alguns êxitos em Portugal. Ele tem vários projetos e tem vários nomes artísticos e um deles é Zé Rascunho, outro é One Man Show e o próprio nome dele, João José Clemente. É excelente músico, guitarrista e vocalista. Ele canta de tudo e tenta imitar tudo e todos… pelo menos uma vez por mês está na televisão. Portanto, a música já nasceu connosco.

Está no vosso ADN…
Sem dúvida.

 

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E o vosso pai, também tocava?
Não. Só o meu avô e o meu tio.

E, vocês aprenderam todos de ouvido?
Aprendemos todos de ouvido. Eu antes de vir para aqui, com 15 anos, em Portugal ia todos os dias à igreja tocar guitarra e cantar. Também aprendi com outras pessoas. Cheguei cá na madrugada de um sábado e à tarde já estava a tocar num conjunto.

Com que idade aprendeste a tocar o primeiro instrumento?
Acho que tinha 10 anos.

E o Carlos?
O Carlos é pouco mais novo do que eu e andava sempre connosco e cresceu a ver-nos… não estou certo, mas com 15 anos ou 16 anos ele tocou numa passagem de ano e lembro-me muito bem da primeira canção que ele tocou e estava nervoso. Ele estava no órgão e na guitarra e ajudava a cantar. O meu irmão é muito bom nas vozes. Ele tanto pode ser o vocalista principal como pode ser o vocalista de apoio.

A banda SAGRES, entretanto, começa a crescer…
… é verdade…

 

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Créditos: Alberto Nogueira

 

… e a vossa fama passou a fronteira do Canadá.
Sim e começámos a tocar nos Estados Unidos e a partir daí ficámos com a agenda mais cheia. Era quase todos os fins de semana… e como eu tomava conta dos contratos, não tinha coragem de dizer que não a ninguém, mas perguntava aos colegas da banda – quando alguém ligava de Boston, Nova York, etc. -, se queriam ir e eles ficavam sempre entusiasmados porque era novidade.

Até era bom receber esses convites, pois era o reconhecimento do vosso trabalho, não é?
No princípio era… mas com o tempo, as viagens começaram a ficar muito monótonas, muito compridas, são 10 horas de viagem!

Não levavam as vossas famílias?
Alguns de nós levavam. Eu quase sempre levava a minha mulher. O Mike, por exemplo, levava a família e fazia umas miniférias porque, às vezes, iam à quinta-feira e ficavam até domingo.

Assim, financeiramente, não era rentável…
Não.

Fizeram o Canadá e os Estados Unidos… o que faltou?
Nós chegámos a uma certa altura que já só faltava Portugal, mas não houve nenhum santo da terra… chamam todos e toda a gente, mas a SAGRES nunca foi chmada.

Do vosso repertório, qual é a canção que mais gostavam?
A Noiva do Mar, que foi feita na minha terra. Foi escrita por uma senhora amiga e o meu tio fez a música só em guitarra. De vez em quando lembrávam-se e cantavam uns versos na brincadeira e nós gostávamos da melodia, da música e da letra e então pedimos autorização e fizemos os arranjos. Tem sido a música que nos tem dado mais sucesso.

Mas compuseram outras?
Sim… isto é como qualquer outro grupo para ser identificado. Nós pensámos em fazer um CD e gravámos SAGRES, em Mississauga com o Hernâni Raposo e ficámos contentíssimos com o trabalho que foi feito. Apesar das pessoas já não comprarem muito CDs, porque nos dias de hoje já outras maneiras de se ouvir música, começámos a gravar um segundo CD, antes da pandemia.

 

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Quem é que escrevia as letras?
O meu irmão e eu. É engraçado. Uma das músicas que deu mais sucesso foi quando estávamos na banda Português Suave, uma canção chamada Barriguda, que escrevi num quarto de hora no meu escritório. Essa canção já foi copiada em Portugal e foi o meu irmão que me mandou um vídeo há tempos com esse registo.

E conseguiram acabar as gravações do segundo CD?
Não, quando a pandemia apareceu, nós tivemos que parar, não é? Nós não podíamos estar juntos e, assim tivemos quase um ano e meio, cada um tocava em sua casa, ensaiava, mas o projeto parou.

E depois, concluíram?
Não!

Porquê?
Depois da pandemia, não voltámos com a mesma “garra”.

Por falta de interesse do público ou vocês próprios?
Ora bem, a seguir à pandemia não havia contratos por razões obvias, mas já estavam a começar a aparecer. A banda SAGRES sempre foi uma banda que queria agradar a todos e por vezes não a nós próprios. Nós tocávamos certas músicas que não gostávamos, mas que tínhamos que tocar. Nessa altura chegámos a questionar: “É pá, porque é que nós não tocamos só música de que gostamos?”, mas por vezes isso não dava porque, por exemplo, um clube ou uma organização estava a pagar-nos para agradar ao seu público, claro que eles não o diziam, mas nós sabíamos isso! Nós tocávamos canções dos anos 60, 70 até às atuais e nós tentámos ser o melhor possível, apesar de não sermos grandes músicos, mas somos bons músicos e éramos uma grande banda.

A banda SAGRES trouxe muitas alegrias e deixa muitas memórias…
Lá está, fomos sempre uma banda para alegrar os outros!

Então, porque não aproveitaram a pandemia para se reinventarem?
Nós até chegámos a falar em várias coisas… como sabe, os espetáculos que nós fazíamos eram, praticamente, Dinner/Dance e nós estávamos a pensar em fazer um espetáculo diferente das outras bandas e ter a Soft Music, só acústicos com guitarras e um acordeão… mas nada foi avante.

Não houve acordo dentro da banda?
Ideias diferentes dentro da banda.

Que têm que ser respeitadas, não é?
Nós damo-nos maravilhosamente bem, porque sempre respeitámos as opiniões uns dos outros, e por isso nunca decidimos assim: “Sim, vamos em frente com essa ideia ou aquela ideia”. Foi tal e qual como foi com o segundo CD, começámos o trabalho e começámos a falar e a trabalhar em canções, mas nunca concluímos.

Agora, quando é chegaram à conclusão que estava na hora de acabar com a banda? Foi a pandemia que apagou a “chama”?
A decisão foi tomada há mais de 1 ano e meio. A pandemia apagou um pouquinho a “chama”, mas não só. Houve, também, outra coisa que ajudou a apagar a “chama”, nós éramos uma banda organizada, que tinha o próprio autocarro para ir para as festas. Nós não alugávamos autocarro, nós tínhamos um autocarro e de vez em quando as famílias iam connosco e as nossas viagens eram uma festa, mas o autocarro já estava a ficar velho e com a pandemia não fazia sentido pagar seguro e decidimos acabar com o autocarro e com isso, para nós, parece que nos roubaram qualquer coisa, que perdemos um bocado da banda SAGRES… o autocarro tinha o logo da banda. Nós íamos na autoestrada e o pessoal apitava (risos)… era muito engraçado.

De todos os eventos que fizeram, há algum destacaria?
Foram todos bons! Fomos sempre bem tratados. Nós somos de Bradford, que é a nossa e primeira casa, mas eu posso dizer que Centro Cultural Português de Mississauga foi a nossa segunda casa. No verão passado fomos tocar, pela segunda vez a Massachussets, onde tivemos 10.000 pessoas, era um espaço aberto e quando estávamos no palco e vimos o recinto cheio de pessoal a dançar… nós estávamos no “céu”! Também fomos a Palm Coast, na Florida, para o aniversário do clube e foi maravilhoso. São tantos que acho que não há um sítio que diga assim “eu não gostei”.

 

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Mas porque decidiram acabar em abril no Centro Cultural Português de Bradford, sem pelo menos fazerem uma festa vossa de “despedida”? Ou será que há alguma esperança que possam voltar daqui a 1 ou 2 anos?
A banda SAGRES, não! Nós já falámos acerca disso. Pode e há a possibilidade de voltármos, porque a música está dentro de nós todos…

… exatamente, mais uma razão para voltarem!
Mas as vidas mudam. Alguns do grupo têm filhos pequenos e está-lhes a acontecer o que aconteceu comigo quando os meus eram pequenos, que é os miúdos perguntarem: “pai, vais sair outra vez?” ou no caso do Patrick que tem namorada e não a vê durante os fins de semana. A própria idade e o cansaço também… depois de uma semana de trabalho, sair à sexta-feira de casa e regressar no domingo e voltar ao trabalho na segunda-feira… não é fácil.

Acho que ninguém duvida disso…
A idade já cá está e sou o mais velho do grupo e nunca negamos isso no palco. Tentámos, sempre que possível, falar o mais possível de nós os 5 no palco, para que toda a gente conhecesse quem eram os elementos da banda SAGRES. Não era só música. Acabar com a banda SAGRES custou e está a custar muito, como à minha esposa que já há 1 ano que não dorme em condições… pela Maria nós continuávamos.

E quando menos esperam e já depois de anunciarem oficialmente o fim da banda, eis que aparece o convite para tocar nas celebrações dos 70 Anos Canadá, no Portugal The Festa, que se realizou no Nathan Philips Square, ou seja, no coração de Toronto. Houve dúvidas em se juntarem, mais uma vez, e aceitarem o convite?
Claro que não houve dúvidas!!! Primeiro por causa do que o evento representava, celebrar os emigrantes… nós somos todos imigrantes! E, depois pelo sítio maravilhoso… o palco da praça da Câmara Municipal de Toronto, algo que nunca tinha acontecido. Tivemos o privilégio de ter recebido o convite e gostaríamos de ter tido a oportunidade de homenagear as outras bandas portuguesas maravilhosas dos anos 70 e 80, que existiram antes da nossa, como os Rebeldes, os Primavera, os Five Brothers, os Águias, os Emigrantes, os Pantera e tantos outros que houve e que eram maravilhosos, porém, não nos foi possível, mas foi um momento muito bom!

E se agora vos chegasse um convite para ir a Portugal? Aceitariam?
Mas que pergunta… por mim, eu já tinha ido ontem (risos) e imagino que os outros membro também. Infelizmente, esse convite nunca chegou. Nunca houve essa oportunidade. Muita gente dizia-nos: “vocês deveriam ir a Portugal”… e nós íamos, de férias (risos), mas nunca para ir tocar… esta pergunta foi interessante!

 

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