Aníbal Seraphim
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Aníbal Seraphim

Fotografia como arte - VI

anibal serafim - revista amar

 

Nasceu no Porto, em agosto de 1965. Inspira-se nas boas ações e práticas do avô paterno, Julião Santos, que lhe valeu em 1930 o Grau de Cavaleiro e a Condecoração Torre e Espada, por ter salvado a vida a crianças, tendo colocado em perigo a sua própria vida e ter até perdido um dos membros.

O gosto pela natureza advém dessa ligação familiar de origem do Alto Douro Vinhateiro, onde passou parte da infância, em Tabuaço. Profissionalmente é gestor numa empresa do ramo da metalurgia, mas é nas horas de lazer que encontra o seu espaço no mundo das artes e da fotografia.

Ao adotar a região de Lafões como segundo lar, a fotografia levou-o a contribuir para a divulgação dessa região e seus arredores, através de reportagens em jornais regionais, revistas e páginas de internet de instituições locais, tendo escrito mais de 300 artigos. Usa a forma visual com a divulgação fotográfica de espetáculos, eventos culturais e rurais, aliando a realização de vídeos dessas atividades em Portugal e no estrangeiro. Um dos seus gostos é viajar e aprofundar os conhecimentos culturais de outras gentes e costumes.

Da paixão pela música levou-o a integrar tournées como assistente ou roadie. Essa particularidade acabou por definir a forma como é reconhecido: Aníbal Seraphim. Esse nome consta nos créditos de CDs, DVDs e ficha técnica de uma curta-metragem da qual integrou o elenco, além da participação em teatro e numa residência artística.

No mundo da fotografia, tem 15 fotografias premiadas. Realizou várias exposições coletivas e a título individual conta com nove exposições, tendo já agendadas várias para o ano de 2023. Em 2020 foi presidente de júri no concurso de fotografia de A Previdência Portuguesa.

Contacto: [email protected]
Facebook: Sir.Seraphim
Web: o-homem-da-maquina-cor-de-rosa.webnode.pt

 


Recorda-se como começou a sua paixão pela fotografia?
Recordo que antes da paixão, tudo começou nos anos 70, ainda em criança, com a curiosidade de ver como ficavam as fotografias depois de reveladas, quando os meus pais me deixavam fazer as fotografias. Nunca mais pensei nisso até há 20 e poucos anos, em que por mero acaso, um amigo comprou uma Compacta com 3 megapixéis e uns meses mais tarde comprou uma Reflex. A curiosidade voltou, comprei-lhe a Compacta usada, e a partir daí veio a paixão pela fotografia, ao começar a registar as viagens e concertos. Com a evolução qualitativa das máquinas fotográficas, em 2010 comprei uma Reflex, mas em 2012 é que se dá uma enorme viragem na paixão porque a máquina avariou no Luxemburgo, a meio de uma viagem pela europa, em que fotografava concertos. Aí comprei uma Pentax K-X cor-de-rosa.

O percurso na fotografia teve início como autodidata, ou à medida que o tempo foi passando, obter “aquelas” fotografias exigiu um estudo aprofundado da técnica.
Sempre como autodidata. Ao evoluir para a primeira Reflex comecei a visualizar sites de fotografia para entender melhor os enquadramentos e algumas das regras básicas, e, claro, explorava as potencialidades da máquina fotográfica para ir aperfeiçoando a técnica. Depois surgiram amizades do qual comecei a ir em arruadas fotográficas e nessa ocasião as dicas foram primordiais, mas com a compra da referida Pentax cor-de-rosa, é que surgiu o verdadeiro desafio ao autodidatismo, porque a máquina tem parâmetros e diferenças grandes em relação às máquinas dos colegas, então, “aquelas” fotografias são o fruto desse trabalho.

O seu olhar sobre a realidade fica diferente através de uma objetiva? E esse olhar mudou com o decorrer do tempo?
Entre o ser mais fiel à realidade e provocar propositadamente a diferença, no sentido de deixar um enigma sobre determinada foto, depende do contexto a fotografar. Por exemplo, se estiver a fotografar para reportagens em jornais ou revistas, ou para divulgação de um território, capto a realidade, mas caso seja por lazer, gosto de surpreender e fazer diferente do habitual, despertando a curiosidade visual. Daí que por diversas vezes usei e abusei das ilusões de ótica. Outro olhar que mudou com o tempo, foi o de fotografar a natureza, pois por vezes sinto que há uma espécie de “chamamento” para certos detalhes que a natureza nos oferece e nem sempre os nossos olhos captam, mas com o decorrer dos anos e imbuído no espírito da pureza da natureza, surge esse chamamento.

 

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Como acontece com o impulso de escrever, pintar, desenhar ou esculpir… fotografar passa a ser uma necessidade, ou surge como um meio de autoexpressão pessoal e social?
Curiosa essa questão porque me remete para um percurso de pelo menos 20 anos e é transversal na evolução pessoal, devido às várias fases que já vivenciei. No início era a tal curiosidade, que com as máquinas de cartão de memória se podem captar milhares de imagens num só dia. Sim, passei por essa fase, a fase de sair todos os dias e fotografar. Um dia que não saísse, sentia que me faltava algo! Aí sim, foi a fase da necessidade. Essa fase é interessante se nos permitir discernir que é a fase da “tentativa, erro” e se tivermos a humildade de perceber que afinal não somos assim tão bons quanto julgamos ser, serve para aprender a fotografar pouco e aprender com esses erros.
Remetendo-me para a segunda parte da questão, desde 2017 que fotografo menos e faço-o estritamente para as reportagens ou divulgações. Portanto, faço algo que não fica num ficheiro de computador, mas para ser visto e partilhado, isto como expressão social. Como autoexpressão, vou captando imagens com o intuito de poder imprimir e fazer mostras ou exposições, no caso específico da natureza e das expressões corporais, porque gosto de registar e captar por ser efémero.

Em que medida a fotografia pode ser encarada como transgressão, como arte ou como mensagem subliminar de uma sociedade?
Como transgressão, entendo que aconteça no caso de se captarem imagens para fins apenas de lazer, sem o consentimento das pessoas ou até de locais, como por exemplo numa visita a locais em obras ou locais que esteja expressa a proibição, como acontece em alguns monumentos. Sob o aspeto artístico, é a parte mais interessante do meu ponto de vista, porque é a génese da arte da fotografia, quer seja a um talher para uma revista ou uma paisagem para que possa ser apreciada e divulgada. Sobre a fotografia ser uma mensagem subliminar de uma sociedade, entendo que esse trabalho é muito importante e até relevante. Ninguém esquece as fotografias dos horrores da guerra, das imagens captadas no massacre em Timor-Leste e em muitos outros momentos, pois o poder da imagem pode ser muito forte e chamar à atenção do que é a realidade muitas vezes escondida. Curiosamente, essa questão está muito mais interligada do que se possa pensar, pois por vezes sem transgressão não se pode passar uma imagem da sociedade tal como ela é. No fundo, fotografia é toda ela arte. Entendo que o mais importante é imperar a regra do bom senso.

É difícil captar/obter uma boa fotografia?
Quem me conhece sabe que gosto de usar o sentido de humor e neste caso poderia responder com uma pergunta: “e o que é uma boa fotografia?” Digo isto porque a arte é muito subjetiva e o que pode ser uma boa fotografia para mim, pode não ser para outrem. Não me posso esquecer o que uma vez me disse um júri de um concurso de fotografia, que a sua preferência são fotografias tortas. No entanto, usando o senso comum, e já que estou na fase de fazer várias exposições de fotografia, o que pretendo é expor algo que as pessoas se identifiquem e admirem no contexto global expositivo. Já me aconteceu visualizar uma fotografia que considero que me esmerei bem para a captar, e as pessoas gostaram, mas na vertente expositiva passar despercebida no meio de outras, tal como já me aconteceu o oposto, em que expus fotografias que foram o “plano B” e no final foram as mais admiradas. Respondendo à questão sob o prisma técnico, desde que o fotógrafo, ou qualquer pessoa, saiba tirar partido do seu equipamento e tiver bom gosto, não será difícil.

Uma boa fotografia interpela?
Sim, há fotografias que interpelam, mesmo em contextos diferentes de interpelação. Como exemplo recordo a fotografia dos anos 70 da criança vietnamita a correr nua a fugir do napalm, ou mais recente de um ato de humanidade ao ajudar um refugiado a sair das águas do mar. Por interpelação artística, as fotos que têm ilusão de ótica ou imagens que têm muitas interpretações interpelam pela curiosidade.

A fotografia tem género? Podemos falar de igualdade de género quando fotografamos a realidade quotidiana. Ou há algo transformador no olhar do fotógrafo quando atrás da objetiva está uma mulher ou um homem?
Para ser franco nunca pensei nisso, daí que nunca fiz essa distinção, somos todos seres humanos. Nas arruadas nunca aferi se haveria mais mulheres que homens, mas pareceu-me sempre que a participação seria 50/50. Mas como gosto mais de fotografar a natureza, aí não há géneros. Mas espero nunca ser confrontado por colocar o masculino na foto “O Rosto da Natureza”, em vez do feminino em que deveria chamar “A Face da Natureza” …

A fotografia faz sonhar… É um instante irrepetível?
Nem a propósito falar na fotografia “O Rosto da Natureza” e a seguir ser questionado sobre sonhos e instantes irrepetíveis. É uma fotografia que reflete isso mesmo, fazer sonhar pelas inúmeras interpretações que tem e o instante em que foi captada, pois a natureza seguiu o seu curso e já não é possível vê-la como foi captada. De facto, a fotografia faz sonhar e torna instantes irrepetíveis.
Ao percorrer as ruas para fotografar a vida quotidiana em espaços públicos, na chamada fotografia de rua, em que medida essa fotografia é uma invasão da privacidade das pessoas anónimas.
Essa é uma questão que me confrontei comigo próprio por várias vezes, quando participei nas arruadas: até que ponto posso fotografar um transeunte que vai na sua pacata vida? Qual a finalidade dessa fotografia? Acho que a resposta está mesmo na última questão, qual a finalidade! Lembro-me de que na década de 90 ao abrir um jornal nacional, lá estava eu numa feira de tasquinhas… estava acompanhado e não havia mais ninguém. O repórter poderia ter perguntado se poderia fazer a fotografia dado que estávamos só duas pessoas, até teria feito uma pose e não ficar curvado a petiscar à mesa. Não o fez porque legalmente o podia fazer… e se eu não queria ser visto com aquela companhia? Que implicação poderia ter na minha vida pessoal? É uma reflexão que deve ser feita por quem faz esse género de fotografia, que diga-se, é pura arte, mas, e se fosse quem tira a fotografia a ser fotografado? Gostava que lhe fizessem o mesmo? Abordo desta forma em jeito de reflexão, não que tenha nada contra, aliás, já fiz o mesmo anteriormente, só que, se um dia fizer uma exposição sobre rostos e expressões, uma coisa é certa, será com pessoas que deram autorização. Aliás, até tenho uma fotografia premiada com um rosto de uma senhora à janela, com a devida autorização. Resumindo, é uma linha ténue que separa o que é invasão de privacidade ou não, mas fica ao critério de cada um essa reflexão.

A fotografia é uma espécie de solidão… ou pelo contrário a fotografia pretende evidenciar o desconhecido aos olhos dos cidadãos comuns?
Como abordei todas as questões na perspetiva pessoal, respondo novamente pela minha experiência, que sempre se resumiu ao estado de espírito ao longo dos anos. Houve momentos que procurava essa solidão. Fotografava e inventava histórias como se fizesse o filme da minha vida. Noutros momentos fotografava em grupo ou apenas com amigos. Em ambas as situações o intuito de partilhar as fotografias é evidenciar o que possa eventualmente ser desconhecido ou apenas mostrar o nosso olhar, pelo menos é esse o aspeto que me tenho dedicado nos últimos anos, ao fotografar as formas da natureza.

Carlos Cruchinho

 

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