Nancy Silva-Gagliardi
Há pessoas que marcam de forma indelével a nossa personalidade. Pelo exemplo de força, de resiliência, de amor às suas origens. Nancy Silva-Gagliardi teve a felicidade de ter crescido no seio de uma família que soube, sempre, ser isso mesmo, ou seja, exemplo no melhor sentido da palavra. A Nancy criança, em plena Peixaria Sagres, ou no escritório de seguros do pai Armindo, mesmo sem saber, estava a aprender como o trabalho e a determinação ajudam a atingir objetivos. A Nancy que se deixava encantar com as decorações da peixaria, feitas pela avó Arlete, por ocasião dos Santos Populares, com as lanternas de papel e os manjericos, que traziam Lisboa a Toronto. A Nancy que gingava nas ruas da cidade que a viu nascer, à moda da terra da mãe, Ana Maria, vestindo os trajes próprios de quem desce a avenida numa Marcha Popular. Que dançava folclore no palco do First Portuguese, que desfilava nas Paradas de Portugal… foi assim, e não só, que foi assimilando as suas raízes, a sua essência ancestral. A Nancy jovem estudante, que um dia pediu aos pais para ir para a escola portuguesa porque queria manter sempre a ligação aos seus avós e restante família. A Nancy que, com um percurso escolar brilhante, tanto orgulhou os pais e o avô Teófilo quando completou o seu PhD em Biologia Molecular, pela Universidade de York.
Nancy Silva-Gagliardi é, atualmente, uma profissional altamente qualificada, responsável pela gestão do departamento de investigação, do Hospital for Sick Children, de Toronto. Recentemente, foi reconhecida com uma estrela no Portuguese Canadian Walk of Fame e, nesse dia, com ela, presentes ou ausentes, estavam todos os que nunca deixaram que Portugal saísse do seu ser e da sua alma.
A INFÂNCIA
Nós sabemos como a infância é importante na definição da personalidade de todos nós, não é? Tu nasceste e viveste na cidade de Toronto e viveste sempre num ambiente muito português. O que é que resta dessa tua infância muito portuguesa, nos teus hábitos e na forma de viver?
Eu acho que a coisa mais importante para mim foi, realmente, a influência que a cultura portuguesa teve durante a minha infância, durante a minha adolescência e até hoje como adulta. O meu dia a dia era completamente influenciado pelas tradições portuguesas, a língua portuguesa, a culinária portuguesa e uma ligação muito forte com a comunidade, com o First Portuguese e a escola de português. E acho que é a combinação dessas coisas todas, que hoje ainda permanece em mim. Tudo isto teve e tem muita influência na maneira como vivo a minha vida, o meu dia a dia.
Conta-nos um bocadinho como é que foi essa articulação entre a escola canadiana e a escola portuguesa. Foi difícil conciliar as duas?
Ao princípio, eu lembro-me de ser pequenina e chegar ao pé dos meus pais e dizer “Oh mãe, pai, eu quero aprender a falar português”. E para mim era uma necessidade, porque os meus avós falavam inglês, mas não falavam um inglês perfeito e para mim era essencial poder comunicar com os meus avós e com a minha família em Portugal. Portanto, eu, pequenina, quis sempre aprender a falar português. Ao princípio foi fácil enquanto eu andava na escola primária, era um bocado mais fácil, mas quando comecei a frequentar o liceu começou a ficar mais difícil, era mais tempo por dia ou numa escola ou noutra. Estava no liceu até às 15h30 e depois ia para o escritório do meu pai ou para a peixaria da minha avó até às 17h30 e depois diariamente, das 17h30 às 19h30, era a escola de português. No liceu as coisas começaram a ficar um bocadinho mais difíceis, mas até nos momentos mais difíceis em que eu pensava “isto é muito” e me sentia um bocado sobrecarregada com as obrigações da escola de português e da escola de inglês, sempre assumi que isto era uma coisa muito importante para mim. Eu queria manter a ligação com a minha cultura, com o que é parte da minha identidade. E foi por isso que até com as dificuldades que vinha a ter, em equilibrar os trabalhos da escola de inglês e a escola de português, eu me mantive e lá completei o 12.º ano, na escola do First.
E que memórias tens da escola portuguesa? Ainda manténs relacionamento com alguns colegas desse tempo?
Não tenho relacionamento nenhum com colegas meus que andaram na escola de português, mas também… eu andei em várias escolas, da primeira classe ao 12.º ano, na comunidade portuguesa, entre a Dundas e a College, entre a Spadina e a Crawford, andei em três ou quatro escolas diferentes, consoante o ano de aprendizagem. Mas o que mais recordo é que tive professoras excecionais. Excecionais, mesmo. A Dona Sylvia, que foi a minha primeira professora da escola de português, a Dona Branca que tive durante muitos anos, a Dona Ana, o Professor Ferreira, todos ótimos professores. Tiveram muita influência na minha aprendizagem e, mais, sempre me motivaram para continuar. Deram-me sempre aquele encorajamento quando eu me aproximava deles e dizia “olha, eu vou ter dois exames para a semana” e eles diziam “tenta o teu melhor e vais conseguir”. Mas tenho memórias muito, muito, lindas da escola de português. Havia as festas do Natal e as festas da primavera, onde as classes todas faziam uma peça de teatro ou qualquer outra coisa, tudo sempre em português no salão do First. Desde pequenina até, como digo, ao 12.º ano, passei por lá muito, muito tempo da minha infância e adolescência.
E dançaste no Rancho Infantil, não foi?
Sim.
E ainda te lembras de algumas danças?
Algumas… quer dizer, já não consigo dançar como dançava, mas até é interessante, porque quando eu estou a ver um rancho folclórico, às vezes até me dá vontade de tentar dançar, mas se calhar já não conseguia muito bem (risos). O Rancho Folclórico também foi uma grande parte da minha infância. Até que chegou a um certo ponto que já era eu e umas outras meninas, que andávamos no rancho desde muito pequeninas, que ensaiávamos o rancho folclórico, isto durante uns três ou quatro anos. Atuávamos no clube, quando havia eventos na comunidade, especialmente durante as festas do Dia de Portugal. Boas memórias. Bons tempos.
AS MEMÓRIAS E AS REFERÊNCIAS
Por falar em boas memórias… eu sei que tens como referência na tua vida e muito boas memórias dos teus avós e dos tempos em que viveste muito ali à volta da tua avó Arlete, do teu avô Teófilo e da Peixaria Sagres. Que memórias é que tens desses tempos?
Quer dizer, só para teres uma noção, quem eu conhecia verdadeiramente e com quem me dava era com as minhas colegas da Augusta, colegas que tive oportunidade de rever passados 30 anos numa das festas da Federação, e conhecia-as melhor do que propriamente as minhas vizinhas, as que viviam próximo da minha residência. Isto porque eu ia para a peixaria depois da escola, depois ia para a escola de português, depois voltava para lá… e passei lá anos. Até a minha avó fechar o negócio e depois ia para o escritório do meu pai, também fazia a mesma coisa. Portanto, propriamente a minha infância foi na zona da Augusta, a crescer ao pé da peixaria, da minha avó e do meu avô. E a minha avó, quando era tempo das marchas populares, eu era muito pequenina e não me lembro, quer dizer só me lembro de ver as fotografias, a minha avó enfeitava a montra da peixaria com manjericos e aquelas lanternas das festas populares e das marchas e eu lembro-me, nitidamente, de andar nas marchas, vestida com trajes regionais feitos pela minha madrinha e também me lembro de sair muito nas paradas do Dia de Portugal.
Da tua avó Arlete, do teu avô Teófilo, como do teu pai, da tua mãe… ficou também o facto de serem todos muito agarrados ao valor do trabalho com responsabilidade, da dedicação ao trabalho? Achas que isso marcou a pessoa que és hoje?
Sim, eu acho que sim. Tanto os meus pais como os meus avós dedicaram muito do seu tempo aos respetivos negócios que formaram. Os meus avós ao negócio da peixaria, os meus pais ao negócio dos seguros. Todos trabalharam muito e eu acho que o facto de ver a dedicação que eles tinham, não só ao negócio deles, mas também ao trabalho para a comunidade, isto deixou uma marca muito profunda em mim. E acho que foi a coisa principal que desenvolveu a minha ética de trabalho. Havia muitas noites, por exemplo, que o meu pai não jantava connosco, porque estava a trabalhar ou estava envolvido nalguma coisa comunitária. Foram estes exemplos que me ensinaram o valor do trabalho árduo e da dedicação à comunidade e da dedicação à profissão.
Qual é a memória dos teus tempos para além do estudo? Quando tinhas um bocado de tempo livre, a que é que te dedicavas?
Do que me lembro, assim de pequenina e de adolescente, na verdade, eu nunca tive muito tempo livre. Andava sempre envolvida em qualquer coisa. Quando era pequenina, se não fosse o rancho folclórico aos sábados, era lições de piano, ou a escola de português… isso ocupava a maior parte da minha semana e do meu fim de semana. Depois, quando fui crescendo, eu despendi muitas horas voluntárias a trabalhar em hospitais e pronto… tempo livre, livre, nunca tive assim muito, mas gostava de ver televisão e despender um bocado de tempo com as minhas amigas. Mas tempo livre nunca foi assim uma coisa que tivesse em excesso. Antes pelo contrário.
DE ALUNA DEDICADA A PROFISSIONAL DE EXCELÊNCIA
Tanto quanto sei, na escola foste sempre uma aluna brilhante ao longo de todo o teu percurso escolar, mas quando é que tu notaste em ti esta apetência pelas ciências? Quando é que tu olhaste para ti e disseste: “Bom, é isto que eu quero fazer na vida, quero ser investigadora científica”, quando é que tomaste essa decisão?
Quer dizer, eu descrevo-me como uma aluna dedicada. Brilhante, não sei, mas dedicada, sim. Desde pequenina, gostei sempre de ciências, de coisas naturais, de investigação, mas eu acho que foi na escola secundária, no 10º ou no 11.º ano, mais ou menos, em que eu tive uma professora de ciências/biologia que me interessou muito ou me fez interessar muito pelas ciências. Porque, até aí, era ou ciências ou economia e ela acho que foi o catalisador para me ajudar a decidir.
Mas porque ela era uma professora fascinante ou porque ela te disse “vai por este caminho”?
Não, ela não me disse, mas ela era uma professora fascinante. Ela cativou-me. E foi por ela que eu decidi seguir ciências na universidade.
E chegou o momento em que tu tiveste que decidir para qual universidade irias estudar. O que é que pesou na tua escolha?
Sim, eu tirei o meu curso, o meu undergraduate degree e o meu doutoramento na York University. Eu tive ofertas das universidades todas para que apliquei. E ao fim do dia, para mim, a localização da universidade, era uma coisa importante, porque eu não queria estar muito longe de casa, claro, mas também queria frequentar uma universidade onde o rigor académico fosse excelente. A York University há 33 anos, se calhar não era das universidades mais conhecidas pelo Departamento de Ciências, mas uma coisa que tinha, e que se calhar agora consigo apreciar melhor, era que o departamento comparado com o da Universidade de Toronto era relativamente pequeno, e isso deu a oportunidade aos alunos da faculdade para terem acesso a laboratórios e terem mais oportunidades para tentar experiências e com mais frequência, do que propriamente se eu andasse numa universidade com uma população de undergraduate muito maior. Por isso foi uma boa escolha, eu acho que sim. E também conheci o meu marido na York, portanto, eu acho que escolhi bem, sim (risos).
O percurso, para toda a gente que chega onde tu chegaste, que é o topo da carreira académica, uma vez que completaste o PhD, é um percurso longo e difícil e, às vezes, desesperante. Nunca pensaste desistir?
O caminho para um PhD é, de facto, longo. É muito desafiador, é muito difícil às vezes, uma pessoa encontra muitos obstáculos e, às vezes, pensa, pelo menos eu pensei – “bem, será isto mesmo que eu quero fazer?”. Uma experiência não resulta, tenta-se de novo, e de novo, até que temos que pensar noutra maneira de fazer esta experiência, de colocar a questão de uma maneira diferente. E é difícil, mas eu, para ser franca, acho que acabei por não desistir, muito graças ao apoio que tive dos meus pais, do meu avô, do meu marido, da minha família e dos meus colegas. Houve momentos desesperantes que eu disse “não, isto não é para mim”, mas, ao mesmo tempo, nunca deixei que esse pensamento se tornasse uma realidade.
Qual foi a área específica de investigação científica a que te dedicaste?
O meu PhD foi em Biologia Molecular, mas depois do meu doutoramento, quando comecei a trabalhar como post-doctoral fellow no SickKids Hospital, eu mudei de área de pesquisa. Eu comecei a focar-me em Molecular Biology da mesma maneira, mas investigando um gene que está envolvido em cegueira infantil e em certos tipos de cancro. E foi um percurso muito interessante. Ah, eu adorei! Adorei a pesquisa na banca do laboratório. Deu-me a oportunidade de contribuir com publicações em revistas com um impacto científico bastante alto. Foi uma área que me ensinou muito, porque foi diferente do que eu estudei para o meu doutoramento. Aprendi muito e desenvolvi-me bastante profissionalmente.
Houve um momento da tua vida em que decidiste sair da banca do laboratório e seres aquilo que és hoje. Tens um cargo de grande responsabilidade no The Hospital for Sick Children de Toronto, um dos maiores hospitais do país, onde geres, precisamente, toda essa área do setor de investigação. Porque é que tomaste essa decisão?
Eu adorei o meu tempo na banca do laboratório, mas também é um encargo que puxa muito pela pessoa. São muitas horas extraordinárias, algo fora do comum de um emprego normal, vamos dizer, em termos de horas normais. Às vezes não há fim de semana, às vezes temos que ir para o laboratório a meio da noite, em dias de férias e eu tive que decidir, porque, entretanto, tive os meus filhos e quando me tornei mãe, para mim a minha prioridade mudou.
Mas passados já 11 anos de estares neste cargo, nunca te arrependeste de ter deixado a investigação científica?
Não, nunca me arrependi. Se me perguntares se, às vezes, sinto falta do interesse em desenvolver uma experiência, sim, ainda sinto falta. Mas nunca me arrependi.
O facto de teres essa experiência anterior de investigação científica, de estar na tal banca dos laboratórios, ajuda-te a olhar para o edifício que estás a gerir hoje e, concretamente, esse setor mais ligado à investigação, de uma outra maneira?
Sim, e é essa a vantagem que me dá ter tido essa experiência. Eu posso estabelecer uma ponte e compreender os cientistas que estão a trabalhar, que me estão a fazer uma pergunta, que precisam de mudar o laboratório para conseguir trazer alguma infraestrutura diferente, para conseguirem realizar as experiências que querem completar e ajuda-me muito ter essa formação, essa experiência. E também me deixa apoiar as pessoas de uma maneira diferente. Porque, às vezes, não é tudo possível, mas eu também tenho conhecimento que me deixa pensar em alternativas para lhes oferecer e isso também é importante.
PROFISSIONAL, ESPOSA E MÃE
Já disseste que ao longo do teu estudo universitário conheceste o teu marido, ele próprio também desenvolveu o seu PhD e é, ainda hoje, investigador científico. Só depois de terminarem os respetivos cursos e as respetivas caminhadas académicas é que disseram: “Pronto, então agora vamos casar”. Achas que tomaram a decisão certa?
Acho que tomámos a decisão certa. Pôr à frente de nós, a nossa educação, terminar o nosso curso e então, depois, pensar em casar. Quer dizer, eu acho que se nós tivéssemos casado durante o nosso percurso… é difícil dizer o que poderia ter acontecido, mas eu acho que é um percurso um bocado difícil, são muitas horas, eu teria que me concentrar numa coisa e não em ser dona de casa, ser mulher, provavelmente, ter filhos mais cedo, quem sabe. Eu acho que nós tomámos a decisão certa.
Entretanto, nasceram os teus filhos, os dois muito seguidos, digamos, com um ano e meio de diferença entre eles, a tua vida mudou?
Sim, completamente. As minhas prioridades mudaram. Não é que a minha carreira não seja importante, não é isso, mas a minha prioridade mudou e passou a ser – ser mãe. Tudo muda. As nossas responsabilidades, as nossas prioridades diárias. Tudo, completamente. Eu nunca me esqueço, quando entrei no gabinete da minha chefe, quando já estava a fazer o meu post-doctoral fellowship, já no SickKids Hospital, para lhe dizer que estava à espera de bebé, ela, como é mulher, mãe e avó agora, ela disse, eu vou dizer em inglês porque sai melhor, “Congratulations! Welcome to motherhood and welcome to worrying for the rest of your life until the day you die”.
Muito animador… (risos)
Sim, (risos) mas foi uma coisa que ficou sempre na minha mente. Porque quando uma pessoa é mãe, essa caminhada vai ser cheia de altos e baixos, e é, provavelmente, a caminhada mais difícil em que qualquer mulher vai embarcar na vida dela, mas pode ser a mais bonita, a que traz mais alegria.
Conseguiste atingir o objetivo que tinhas, de te passares a dedicar mais aos teus filhos, mudando de área profissional?
Os meus filhos agora já são adolescentes, mas quando a minha mudança profissional aconteceu, ela veio numa altura muito apropriada para eles e para a nossa família, quando eles eram mais pequeninos. Deixou-me estar mais presente. Deixou-me estar à mesa e jantar com a minha família, todos os dias. E eu acho que foi a altura certa e importante para eu lhes poder dedicar o tempo que eles precisavam de mim, naquela altura.
Como é que te classificas como mãe?
Eu espero que se essa pergunta fosse feita aos meus filhos, que eles dissessem que eu sou uma mãe que dá apoio, dá amor. Tento dar-lhes os melhores conselhos que eu sei, consoante o que eu aprendi e o que eu sei porque este mundo agora está bem mais complicado do que era, por exemplo, quando eu tinha a idade deles. Eu tento apoiá-los da melhor maneira possível.
Mas és uma mãe protetora?
Eu acho que sou uma mãe protetora. Quando eles eram mais pequeninos, até certo ponto, se calhar um bocado controladora, não sei. Mas eles vão crescendo e também eu vou aprendendo com eles. É o que eu lhes digo: vocês vão crescendo, vão passando por etapas diferentes, até na vossa adolescência, mas eu também vou aprendendo com vocês, porque eu, como mãe, nunca passei por isto, também. Eu tento aprender com eles, mas a coisa mais importante para mim é que tenhamos uma relação em que eles se sintam confortáveis em vir falar comigo e mantermos uma comunicação aberta, para eu saber se eles precisam de ajuda, se precisam de falar, se precisam de alguma coisa. Para mim, isso, especialmente nos dias de hoje, é a coisa que me preocupa mais. E a coisa que eu tento manter sempre na minha mente, é ser uma mãe que apoia, que suporta. Que lhes dá espaço, mas ao mesmo tempo os mantém perto o suficiente para eles saberem que nós estamos cá para eles.
Tu és casada com um canadiano de origem italiana. De que modo é que conseguiste passar Portugal e a cultura portuguesa para os teus filhos?
Para os meus filhos foi um bocado mais difícil do que quando eu era pequenina e a crescer. Eles não têm a mesma necessidade de aprender a falar português que eu tinha, para comunicar com os meus avós, eles facilmente falam inglês com os avós. Mas eu encorajo os meus filhos a falar português. Eles não falam português muito bem, mas percebem. Tento manter a ligação e, quando possível, vamos visitar a nossa família em Portugal. Nós temos família do lado da minha mãe e do meu pai em Portugal e sempre que possível adoramos passar férias em Portugal. Eles adoram Portugal e eles adoram comida portuguesa. Agora que são mais crescidos, também vou ver se consigo envolvê-los mais na comunidade portuguesa, em eventos comunitários. Eu tento falar português, o meu pai e a minha mãe tentam falar português com eles e vamos ver se, assim, é suficiente para manter as ligações. Eles adoram Portugal, adoram visitar a família e visitar o país e é para mim a maneira mais fácil de manter esta ligação muito importante.
São dois adolescentes, como tu disseste há pouco, estamos num mundo complicado, quais são as tuas maiores preocupações com dois rapazes adolescentes em casa?
Uma mãe preocupa-se sempre, com tudo, mas eu acho que é a segurança dos meus filhos, a segurança física, em termos de saúde e do estado emocional deles é o que me preocupa mais, especialmente com as pressões todas que os adolescentes têm agora, no mundo em que a gente vive. Para mim, é a coisa que me preocupa mais e é por isso que eu tento o meu melhor, para os apoiar e suportar. A minha maior preocupação é, realmente, saber que eles, emocionalmente e fisicamente, estão num estado saudável, fortalecidos.
A ESTRELA NO PCWOF
Nancy Silva-Gagliardi, a partir de agora, o teu nome está no Portuguese Canadian Walk of Fame, um mural onde figuram já muitos nomes, todos eles com alguma história ou de ligação direta à atividade comunitária ou como portugueses que se destacam na sociedade canadiana, de uma forma geral. O que é que tu sentes quando passas por ali e vês a tua estrela?
Bem, é realmente uma grande honra ser nomeada e ser selecionada para ter uma estrela no Portuguese Canadian Walk of Fame, mas para mim acima de tudo significa a ligação da minha infância, da minha adolescência e da minha vida à comunidade portuguesa. Foi mesmo nesse local, onde está o monumento comemorativo do Portuguese Canadian Walk of Fame, que eu passei muitos anos da minha vida, no First Portuguese, e foi aí que eu desenvolvi a ligação à minha cultura e à herança dos valores portugueses da comunidade. Esse local, para mim, é muito especial.
A partir de agora sentes que a responsabilidade de promoção da cultura portuguesa, a promoção de Portugal acaba por ser ainda maior?
Eu acho que sim. Quer dizer, ser reconhecida no Portuguese Canadian Walk of Fame, acho que traz consigo uma responsabilidade maior para promover a comunidade portuguesa. Dentro dos meus possíveis, vou aproveitar futuras oportunidades para poder continuar a fazer a mesma coisa. Como já disse, de pequenina e de adolescente, o meu envolvimento na comunidade portuguesa foi muito mais acentuado. Houve um tempo na minha vida em que tive que priorizar a minha energia e o meu tempo para a minha família, para os meus filhos. Agora acho que estou a entrar numa etapa da minha vida em que posso começar a dedicar mais um bocadinho, e ver de que maneira posso contribuir mais para o desenvolvimento e maior conhecimento da comunidade.
O FUTURO
Como é que vês o teu futuro, Nancy? Portugal continuará a estar presente? Achas que alguma vez te poderia passar pela cabeça viver uns tempos em Portugal, por exemplo?
Portugal estará sempre no meu coração, sim, claro! Viver uns tempos em Portugal é um bocado difícil de dizer, porque não sei. O futuro é imprevisto. Eu não sei o que é que o futuro vai trazer. Onde é que os meus filhos irão estar, mas claro que queria estar próximo deles, se fosse possível. Como toda a mãe, acho eu. Mas o meu futuro… quer dizer, sem ter uma bola de cristal, eu acho que se puder continuar a crescer pessoalmente e profissionalmente e continuar a poder contribuir no meu emprego para o desenvolvimento do SickKids Hospital e, de alguma maneira, para a comunidade portuguesa, será uma coisa que me vai trazer muita alegria.
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