Ana Bailão: Construir a cidade, liderar a habitação acessível e a inovação social
Entrevistas

Ana Bailão: Construir a cidade, liderar a habitação acessível e a inovação social

ana bailao - revista amar
Créditos: Ana Bailão

 

Ana Bailão nasceu em Vila Franca de Xira, em Portugal, e aos 15 anos aventurar-se-ia para o Canadá com a sua família. Instalada em Davenport, onde permanece até hoje, envolveu-se desde cedo na comunidade portuguesa. Após completar uma licenciatura em Sociologia & Estudos Europeus na Universidade de Toronto, descobriu o bichinho da política ao acaso, depois de ser desafiada pelo City Councillor Mário Silva para ser sua assistente.

Em 2010, foi ela própria eleita como City Councillor para representar Davenport, tendo vencido a última reeleição com 83.62% dos votos em 2018. Em 12 anos de vida política, assumiu o papel de vice-presidente da Câmara Municipal de Toronto durante os últimos 5 anos. Entre as várias missões que abraçou, destaca-se a inovação social e o compromisso com a habitação acessível na cidade de Toronto. O seu apoio estendeu-se também à comunidade portuguesa, quer no apoio às várias organizações sem fins lucrativos e associações, quer na representação da comunidade portuguesa no Canadá. Em maio de 2022, depois de vários anos de entrega à cidade, Ana Bailão anunciou que não procuraria a reeleição para a Câmara Municipal, mas manteria a sua missão social, e no início do ano assumiu o papel de Chefe de Habitação Acessível e Assuntos Políticos na Dream.

Agora, depois de John Tory renunciar ao cargo de presidente da Câmara Municipal de Toronto, será que Ana Bailão voltará ao jogo político e a representar a comunidade como a primeira portuguesa a liderar a cidade de Toronto?


 

Desde que decidiu anunciar a tua candidatura, mudou algo em si em relação a essa decisão? Ou mantém-se firme, que foi e é a decisão certa?
Aí sim, com certeza! Estou firme que tomei a decisão certa. Estou mais confiante do que nunca, que sou a melhor candidata, pois tenho a experiência, tenho o currículo, portanto, já tenho trabalho feito na Câmara e tenho o plano. Há muitos candidatos, como a Olivia Chow, que só falam em aumentar impostos. Eu reconheço que as pessoas estão em dificuldades e que não é isso que esta cidade precisa e que não é isso que os moradores desta cidade precisam. Esta cidade precisa de alguém que no dia 27 de junho arregace as mangas, melhore os nossos serviços, mas que tenha em consideração o quanto as pessoas estão a ter dificuldades e que não é a aumentar impostos que vai resolver os problemas das pessoas, pelo contrário! O que é preciso fazer é ter os serviços mais eficientes e fazer a vida mais fácil e mais acessível para os moradores desta cidade.

Hoje, dia 29 de maio, anunciou mais um plano para a pasta que está junto do seu coração, que é a Habitação. Quais são alguns dos pontos do plano?
Nós precisamos de vários tipos de habitação… Precisamos de mais habitação em geral, porque a cidade está a crescer e nós não estamos a construir ao ritmo que é preciso e isso obviamente tem um impacto nos preços, portanto, nós precisamos de mais habitação para que a nossa classe trabalhadora e os nossos jovens continuem a poder viver aqui, na cidade, e tenham mais opções de viver aqui, na cidade. Portanto, estou comprometida a trabalhar com a província para construir 285.000 fogos habitacionais, que foi o que a província disse à Câmara de Toronto que tinha de se construir. Eu comprometi-me que desses 285.000, 57.000 serem prédios de arrendamento, porque outro problema que nós temos é que nós não estamos a construir há décadas prédios de arrendamento suficientes e quase metade da população, hoje, ainda arrenda na cidade e é por isso que as rendas estão tão caras, porque não há, mais uma vez, produto suficiente e isso tem um impacto nos preços.

Mas na pasta da Habitação há outras lacunas…
Sim, temos aquelas pessoas que precisam de habitação acessível, mas que não é só habitação, pois também precisam de apoios. São pessoas que, por vezes, têm traumas, problemas de saúde mental, vícios, portanto, alguns problemas de saúde e que precisam de mais do que só um teto sobre a cabeça e é o que nós chamamos aqui o Supportive Housing e isso eu já construí como vereadora. Tivemos vários projetos pela cidade e até usamos um tipo de construção inovador, que é a construção Modular, em que a maior parte da estrutura é feita na fábrica e depois é montada quando chega ao local, e isso faz com que a construção seja muito mais rápida. Eu, por exemplo, consegui construir 44 apartamentos em seis meses. O projeto foi aprovado em junho na Assembleia Municipal e em janeiro do ano seguinte, as pessoas já estavam a entrar para as suas casas, para as suas moradias e já tinham os seus apoios disponíveis. Portanto, o que temos que fazer na área da Habitação é ter vários tipos de habitação, porque os problemas não são só em algumas vertentes.

Ou seja?
Nós vimos muita gente a morar na rua e é um problema sério, mas também temos um sério problema perante a nossa classe trabalhadora e os nossos jovens em conseguirem viver. Portanto, nós precisamos de ações nestas vertentes todas da Habitação. Certamente, não é… e mais uma vez trago aqui o nome da Olivia Chow e de outros candidatos que só querem que a Câmara construa tudo -, aumentando os impostos para fazer essa construção só pela Câmara que vai resolver o problema. Nós não podemos fazer isso.

 

ana bailao - revista amar
Créditos: Ana Bailão

 

Então, qual é a solução?
Nós precisamos de todos os níveis do governo, precisamos do setor privado e precisamos do setor não lucrativo na mesa para resolver a questão da Habitação. Não é a Câmara Municipal aumentar os impostos em força para construir habitação para toda a gente que vai resolver o problema.

No caso que a Olivia Chow – ou um dos outros candidatos – decida aumentar os impostos, como se já fossem poucos, com as rendas altas que já existem e com tudo mais caro, fica a pergunta: como é que as pessoas vão viver? Depois das contas pagas, o que sobra para comer? Qual é a solução a médio prazo?
Nós precisamos de construir mais e depressa. Quanto mais oferta houver, mais controle há nas rendas e nós vimos quando foi no início da pandemia que, por exemplo, na baixa de Toronto, quando houve muitos estudantes que voltaram para casa, havia muita oferta e em apenas 2 meses, as rendas baixaram 500 dólares. Portanto, o que nós temos que fazer é criar mais oferta na parte de arrendamento e também criar mais habitação de renda mais acessível, usando terrenos camarários, fazendo parcerias com organizações não lucrativas, para que essas também baixem. Mas, precisamos de ter várias ações na área da Habitação.
Aproximadamente há 2 anos, falou-se em impor uma taxa municipal extra aos senhorios que não queriam alugar os seus apartamentos por um valor inferior e que preferiam mantê-los vazios. Essa medida surtiu efeito?
A taxa foi implementada e de todos os apartamentos que foram identificados, os proprietários de 2.100 apartamentos pagaram, porque preferiram ter o apartamento vazio.

E os outros foram alugados?
E os outros têm sido alugados ou os proprietários vivem neles. Pelo menos estão como habitação, que é isso que nós queremos, que esses apartamentos sejam uma habitação para alguém, seja ele alugado ou seja comprado… a forma como foi não interessa, o que interessa é que possa ser uma habitação para alguém.

Agora, a menos de um mês da corrida eleitoral, o que é que tem projetado na sua agenda?
Olha, temos muitos debates, temos muitas reuniões com muitas comunidades pela cidade toda. Eu ando sempre de um lado para o outro… de Scarborough para Etobicoke e de North York para a baixa. Temos publicidade, temos muito bater às portas e muitos telefonemas e, por isso, deixo aqui o apelo à comunidade portuguesa… esta campanha, especialmente numa campanha de uma cidade com mais de 3 milhões de habitantes, precisa de muita ajuda e eu apelo aos nossos compatriotas, aos nossos portugueses que tiverem um bocadinho de tempo que venham ajudar… fazer uma chamadinha, a pôr os papeizinhos à porta ou pôr umas placas, porque todos juntos nós vamos conseguir isto, mas não vai ser só uma pessoa que vai conseguir lá chegar. Tem que ser uma comunidade unida… um movimento que nós temos que criar e é isso que eu estou a criar.

Há uma “nuvem” dentro da comunidade portuguesa que deveria ser dissipada… infelizmente, ouve-se muito: “Ah, mas a Ana quando lá estive não fez nada por nós!”… aquela conversa de pessoas que não entendem que uma vereadora ou uma presidente de Câmara não está ali para servir só uma comunidade, neste caso a comunidade portuguesa. O que é que gostava de deixar claro a quem pensa assim?
Eu sinto-me bastante orgulhosa pelo trabalho que fiz na área da Davenport, que inclui portugueses e não portugueses. Eu representava os moradores todos da Davenport, mas sinto-me particularmente orgulhosa por todo o apoio e atenção que dei sempre à comunidade portuguesa, incluindo respondendo a certas necessidades da comunidade como, por exemplo, o terreno camarário que conseguimos para a Magellan Community Foundation e os 21 apartamentos que conseguimos para o Luso Canadian Charitable Society para darem habitação às pessoas com dificuldades motoras. Portanto, sinto-me muito, muito honrada por ter podido participar. Ainda em relação ao à Magellan, não só foi o terreno camarário como também foram vários montantes de dinheiro que a Câmara alocou e para qual eu me dediquei. Portanto, acho que são projetos muito importantes, projetos muito significativos para a nossa comunidade e orgulho-me disso e espero poder ter a oportunidade de fazer muito mais.

Para finalizar… quando chegou aqui, Toronto, com 14 anos, alguma vez imaginou estar um dia a concorrer para a presidência da Câmara?
Nunca, nunca… e nem há uns anos atrás eu imaginava isso (risos). Nunca, nunca imaginei, da mesma forma que nem nunca imaginei estar na política. Nem nunca fui daquelas crianças ou jovens que, por vezes, dizem “Ah, eu vou ser política ou vou para a política”, não! Eu envolvi-me na política devido ao trabalho comunitário que fazia e às causas em que andava envolvida. Na altura tínhamos campanhas de cidadania, que eu ajudava; campanhas para lutar contra as deportações e lutei contra as deportações. Depois envolvi-me no Working Women Community Center, que tem o programa de orientação On Your Mark e programas para mulheres imigrantes e para as suas famílias, depois envolvi-me na Federação de Empresários e Profissionais Luso-Canadiana (FPCBP)… foi a fazer trabalho comunitário que veio este envolvimento na política e nunca foi por causa da posição. Foi mais por “o que eu consigo fazer e o que eu posso fazer” e é por isso que eu me sinto tão orgulhosa de hoje olhar e poder dizer assim: “Olha, quando fizemos a Magellan, eu ajudei com o terreno; aqueles milhões de dólares que conseguimos, eu ajudei; aqueles apartamentos todos para Luso, foi devido ao meu envolvimento!” e esse é o melhor sentimento que tenho disso neste momento.

Ana, convido-a a deixar uma mensagem aos seus eleitores e aos nossos leitores.
Eu queria deixar um grande apelo para a nossa comunidade para no dia 26 saírem para a rua e irem votar. Eu sempre estive próxima e defendi a nossa comunidade, tanto que digo sempre que sou um produto desta comunidade e espero que a comunidade sinta isso e que esteja comigo nestes próximos dias de campanha e que, especialmente, esteja lá no dia 26 comigo… para festejar uma grande vitória, porque eu acho que era uma vitória da nossa comunidade toda.

Carmo Monteiro

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